O principio de coesao territorial enquanto novo paradigma de desenvolvimento na formulacao de politicas publicas: (re)construindo ideias dominantes. - Vol. 40 Núm. 119, Enero - Enero 2014 - EURE-Revista Latinoamericana de Estudios Urbanos Regionales - Libros y Revistas - VLEX 488692362

O principio de coesao territorial enquanto novo paradigma de desenvolvimento na formulacao de politicas publicas: (re)construindo ideias dominantes.

AutorSantinba, Gon
CargoArt

RESUMO | A valorizaçáo da dimensáo territorial na formulaçáo de políticas públicas tem sido visível nas orientaçóes emanadas pelas mais diversas instituiçóes mundiais, lançando recentemente para o debate político e acadêmico a Coesáo Territorial enquanto novo paradigma de desenvolvimento. Num momento de particular importância, em que se discutem as orientaçóes para o período pós-2013 e a atribuiçáo dos fundos estruturais, esta questáo assume um interesse adicional nos Estados- Membros da Uniáo Europeia. Embora, corno objetivo político, a Coesáo Territorial tenha vindo a adquirir uma importância elevada, ainda é notória a ausência de uma delimitaçáo precisa do conceito, dificultando a capacidade de lidar de forma analítica e normativa com este princípio. É sobre esta questáo que o texto se debruça, identificando-se caminhos que poderáo contribuir como referencial para a formulaçáo e territorialização de políticas públicas, melhorando, assim, os processos de decisáo com base neste princípio.

PALAVRAS-CHAVE | desenvolvimento territorial, distribuiçáo espacial, integraçáo territorial.

ABSTRACT | There was been a growing interest by several worldwide institutions in both academia and policy making arenas in the territorial dimension of public policy design, discussing the added value of Territorial Cohesion as the new development paradigm. In a stage of particular importance, in which the main guidelines for the post-2013 period and the allocation of structural funds are being discussed, this issue assumes an additional interest amongst the European Union Member-states. Albeit as a political objective Territorial Cohesion is here to stay, there is no agreement on its precise meaning, hence raising difficulties on how to deal with it in an analytical and normative way. This article seeks to bring critical commentary to this arena on this matter by providing a guiding reference for public policies design and territorialization, thus improving decision policy processes based on this principle.

KEY WORDS | territorial development, spatial distribution, territorial integration.

Introduçáo

De uma forma crescente, a dimensão territorial vem assumindo visibilidade na formulaçáo de políticas públicas. A título de exemplo, uma análise dos trabalhos produzidos pela Organizaçáo para a Cooperaçáo e Desenvolvimento Econômico (OCDE, em inglês, Organisation for Economic Cooperation and Development) (2001, 2009) ou pelo Banco Mundial (2009), mostra como estas instituiçóes, de referência em escala mundial, sublinham a importância de abordagens de base territorial como fatores essenciais na formulaçáo de políticas públicas. No quadro concreto das políticas da Comissáo Europeia (tE), esta questão é igualmente visível, tendo sido inclusive adotado, recentemente, o princípio da Coesão Territorial (CT) como o novo paradigma de desenvolvimento do território europeu.

A noçáo de CT advém de um dos conceitos pilares da Política Regional -o da "coesão"--que, ausente do Tratado de Roma (1957), emerge formalmente em 1986 no Acto Único Europeu, fazendo da Coesão Econômica e Social uma nova competência da União Europeia (UE) com o intuito de se promover o desenvolvimento harmonioso do território Europeu. Mas é só com o Tratado de Amsterdã (1997) que surge, pela primeira vez, o conceito de CT num texto oficial. Se é certo que este surge formalmente neste Tratado, com o principal intuito de moderar os efeitos associados à (tendência de) liberalizaçáo dos Serviços de Interesse Geral (Faludi, 2010), não é menos verdade que há quatro episódios institucionais recentes que marcam um ponto de nío retorno na adoçáo deste princípio, do ponto de vista da política pública: a publicaçáo da Agenda Territorialda Unido Europeia (primeiro, em 2007, e a versão renovada, em 2011), o lançamento do Livro Verde sobre a Coesáo Territorial (2008), a inclusão da CT no Tratado de Lisboa (2009) enquanto 3 pilar de atuaçáo a par da Coesío Econômica e da Coesáo Social e, finalmente, o desenho da Estratégia Europa 2020, adotada em 2010, com o intuito de relançar a economia europeia e na qual a CT surge como um dos principais objetivos a atingir.

Procurando incutir a importância do território na agenda política, o princípio da CT surge, no seio destas orientaçóes, com o intuito generalizado de alcançar o desenvolvimento harmonioso de todos os territórios (ou seja, um desenvolvimento socioeconômico equilibrado e equitativo), valorizar a sua diversidade e complementaridades, e facultar a possibilidade da população tirar o melhor partido das características existentes em cada território. Embora o Livro Verde e a abertura do processo de consulta pública sobre o mesmo procuraram clarificar o que se entendia por CT e quais as políticas a tomar para se alcançar esse princípio, ainda se verifica alguma ambiguidade inerente ao seu conceito (o quê) e à sua operacionalizaçáo (como). Esta é, precisamente, uma preocupação que vem emergindo nos últimos anos em diversos países, cujas orientaçóes, claramente influenciadas pela agenda da CE, apontam no sentido de adotar este princípio na formulação de políticas públicas.

É justamente sobre esta ausência de delimitação precisa do conceito e sobre o seu valor acrescentado, enquanto princípio integrante da formulação de políticas públicas, que este texto se debruça, identificando-se alguns caminhos que poderáo contribuir para a melhoria dos processos de decisão e para a própria territorializaçáo das políticas públicas. O texto inicia com uma panorâmica das políticas públicas no espaço europeu, com o intuito de clarificar o caminho traçado até a adoçáo da CT enquanto novo paradigma de desenvolvimento. No seguimento desta narrativa histórica, elencam-se as razóes que justificam a adoçáo deste princípio no contexto atual. Os argumentos expostos constituem o ponto de partida da terceira seçáo, na qual se procura apresentar uma interpretação processual do princípio de CT, para que se possam formular políticas públicas que caminhem no sentido de operacionalizá-lo e promovê-lo. Por fim, na última seçáo, é apresentado um quadro síntese do exercício efetuado que poderá beneficiar, quer futuros debates no âmbito desta temática, quer os próprios processos de tomada de decisáo política, num momento de particular importância em que se discutem as orientaçóes para o período pós- 2013.

A dimensáo territorial nas políticas públicas: rumo à coesáo territorial

Desde sua origem, que a UE tem por missáo promover um desenvolvimento harmonioso das atividades econômicas pela reduçáo das disparidades entre as diversas regióes e do atraso das menos favorecidas (Tratado de Roma, 1957). Uma missáo que adquiriu uma maior relevância por intermédio de Jacques Delors em 1986 com a adoçáo do Acto Único Europeu, estabelecendo uma política comunitária de coesáo econômica e social a fim de contrabalançar os efeitos da realização do mercado interno nos Estados-Membros menos desenvolvidos, e de atenuar as discrepâncias de desenvolvimento entre as regióes. Sem alterar a base e os objetivos da sua gênese, com o passar do tempo esta política foi sendo redesenhada: se, numa fase inicial, a sua concretização na procura da diminuiçáo das assimetrias regionais efetuava-se com base numa distribuição equitativa dos fundos comunitários, mais tarde, constatou-se que nem sempre isso aconteceu (Santinha, Rodrigues & Almeida, 2009). Os trabalhos desenvolvidos por Martin (2003) e pela própria CE (European Commission, 2008) são esclarecedores desta questáo, mostrando que, ao longo dos tempos, embora as desigualdades entre Estados-Membros tenham diminuído (em valores de pIB per capita), as disparidades entre regióes NUTS II dentro de cada Estado-Membro aumentaram, contrariando assim, os objetivos de base para os quais a Política de Coesáo foi desenhada. Surgindo formalmente com o Tratado de Amsterdá (1997), a cr vem dar corpo a esta preocupaçáo com as disparidades, procurando incutir a importância do território na agenda política, não só europeia, mas também de cada Estado-Membro: territory matters é uma expressáo que passa a ser recorrente nas diversas políticas e relatórios de orientaçáo comunitária.

Este recrudescimento do interesse na dimensão territorial das políticas públicas advém muito do trabalho desenvolvido desde a década de 90, no âmbito do ordenamento do território, evidenciando o quáo importante pode ser para se atingirem os objetivos de coesáo tendo em conta a diversidade territorial no espaço europeu (Ionica, 2007). Sem competência formal na tE, em matéria do ordenamento do território, durante vários anos os defensores do princípio de CT optaram por uma estratégia didática, com uma dupla abordagem (Jouen, 2008): uma vertente prática/ operativa, através, por exemplo, do programa comunitário INTERREG0--com uma visáo de ordenamento transnacional--, e uma vertente mais conceitual, na procura de uma visão estratégica comum para o conjunto do espaço europeu, capaz de orientar as políticas públicas com impacto em todas as escalas (da europeia à local). Foi neste sentido que se sucederam um conjunto de estudos acadêmicos, como o Europe 2000 (1991), o Europe 2000+ (1994) e, em antecipaçáo à entrada de 12 novos membros na UE, o EDEC: Esquema de Desenvolvimento do Espaço Comunitário, fator chave para "afirmar uma visão estratégica de ordenamento supranacional do território comunitário" (Ferráo, 2004, p. 48). Documentos aprovados, sublinhe-se, em reunióes informais por parte dos ministros do ordenamento do território e desenvolvimento regional dos Estados-Membros, pelo que quer o vocabulário adotado quer o conteúdo estratégico definido constituíram o resultado de um compromisso político.

Pela sua relevância para o ordenamento do território e pelo seu impacto político e científico, importa aqui destacar o EDEC, quer enquanto documento (e processo) chave em torno do próprio conceito de CT, quer enquanto elemento demonstrador da importância da dimensáo territorial nas políticas...

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