Os grandes projetos urbanos como estrategia de crescimento economico. - Vol. 39 Núm. 117, Mayo - Mayo 2013 - EURE-Revista Latinoamericana de Estudios Urbanos Regionales - Libros y Revistas - VLEX 635661909

Os grandes projetos urbanos como estrategia de crescimento economico.

Autorde Oliveira, Alberto

RESUMO | Os grandes projetos urbanos são apresentados como estratégias de desenvolvimento econômico e social. O objetivo desse trabalho é estudar as experiências de São Paulo e do Rio de Janeiro para mostrar os limites, os custos e as potencialidades dessas estratégias. A investigação mostrou que os resultados obtidos não alcançaram os objetivos desejados pelos defensores dos grandes projetos. As populações socialmente vulneráveis atingidas pelos projetos tiveram perdas. Essas experiências serviram para apontar elementos cruciais que devem ser analisados em projetos importantes em curso no Brasil, especialmente a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.

PALAVRAS-CHAVE | economia urbana, gentrificação, gestão urbana.

ABSTRACT | Large urban projects are presented as a strategy for economic and social development. The aim of this paper is to study the experiences of São Paulo and Rio de Janeiro to understand the limits, costs and potential of large urban projects. The results showed that the goals proposed by defenders of large urban projects were not met. Large projects failed to benefit populations concerned by them. These experiences served to point out crucial elements about the implications of large urban projects. This is very important to Brazil because large projects have been prepared facing the 2014 World Cup and the 2016 Olympic Games.

KEY WORDS | urban economy, gentrification, urban management.

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Os grandes projetos urbanos são entendidos por seus defensores, como estratégias de crescimento econômico lastreadas nas cidades. Tal conclusão está baseada em dois elementos fundamentais: (1) os elevados recursos envolvidos nos projetos tendem a superar os limites orçamentários da cidade, levando a administração municipal a buscar financiamento em outros níveis de governo e/ou no mercado financeiro e de capitais. (2) as principais justificativas desses investimentos, além do potencial efeito multiplicador, são a atração de investimentos e a geração de renda e emprego.

A realização de grandes projetos urbanos, associados ou não a eventos culturais e esportivos de grande visibilidade internacional, não se constitui novidade na literatura, nem tampouco, na história das grandes cidades europeias e latino-americanas. Nos primórdios da Revolução Industrial, Paris foi palco de importantes projetos urbanísticos que buscaram garantir a modernizaçáo da cidade e os meios necessários para a manutenção do processo de acumulaçáo capitalista. A experiência de Barcelona, nos anos 1990, transformou a cidade em modelo de gestão urbana, gerando rebatimentos inconfundíveis em países com diferentes situações socioeconômicas. Na América Latina, a realização de Puerta Madero (Argentina) e as reiteradas tentativas de remodelaçáo da área portuária do Rio de Janeiro são provas concretas do fascínio exercido pelo "modelo Barcelona".

É importante ter em mente que a implantação efetiva de grandes projetos urbanos depende de circunstâncias particulares que são forjadas no entrelaçamento das condições políticas, econômicas e históricas presentes em cada cidade. Retomando o caso de Barcelona, vale lembrar que o aumento da autonomia política e econômica das cidades espanholas (em contrapartida à queda do franquismo) e os vultosos fluxos de investimentos decorrentes do processo de unificação europeia foram fatores decisivos para a implementação daquele projeto urbanístico.

A cidade de Londres, tal como Barcelona, também figura entre os grandes ícones do que ficaria conhecido como "planejamento estratégico": Porém, os ingleses inovaram a experiência ao incorporar novos instrumentos de captação e administração de recursos que aproximavam as relações entre o público e o privado. Na Inglaterra, replicando o observado nos EUA, foram criadas "agências de desenvolvimento" incumbidas de atribuições urbanísticas de áreas previamente delimitadas. Estas agências foram chamadas de Urban Development Corporations (UDCs). Havia, também, as Hausing Associations, empresas de capital misto e voltadas para a construção habitacional e, finalmente, as "Zonas Empresariais", definidas como recortes geográficos do tecido urbano considerados estratégicos, que contavam com incentivos fiscais e financeiros para a atração de empresas.

As UDCs tinham quatro objetivos fundamentais: oferecer terrenos e edifícios para uso efetivo; encorajar o desenvolvimento de atividades comerciais e industriais novas e existentes; atrair o investimento privado; e prover habitações e equipamentos sociais para estimular a ocupação urbana. A estratégia adotada era a de aportar recursos do setor público para incentivar investimentos privados complementares, seja no co-financiamento das obras de infraestrutura ou no desenvolvimento de projetos particulares. Para a gestão da UDC, o governo britânico nomeava um comitê, formado por representantes do setor privado e do governo local que, por sua vez, nomeava o diretor geral. As UDCs deveriam prestar contas de seus gastos e realizações mediante relatórios anuais. (Compans, 2004, p. 37)

As UDC's foram bastante criticadas devido à elevada dependência de recursos públicos, o que levantava dúvidas se o modelo realmente criava parcerias efetivas entre o público e o privado ou, simplesmente, transferência de renda. Sabe-se, por exemplo, que as subvenções governamentais corresponderam à metade do valor disponível no orçamento da política urbana, para os anos de 1990 e 1991. As tensões entre o governo local e as UDCs eram ainda maiores nas cidades governadas pelo partido trabalhista, demonstrando o esvaziamento das atribuições do governo local pela política da primeira ministra Thatcher.

Na renovaçáo da área portuária de Londres (Docldand), dois grupos disputaram o controle do processo: de um lado, as municipalidades trabalhistas defendiam a manutenção do porto e o incentivo à atraçáo de novas indústrias para absorver mão de obra local. De outro, os opositores propunham uma ruptura total com o modelo anterior, priorizando a construção de centros comerciais, de serviços, residências de luxo e a abertura para o capital privado. Em suma, a vitória do modelo baseado nos centros comerciais na batalha pela reformulação da área portuária de Londres, contribuiu para a elevação dos preços da terra e consequente expulsáo da população pobre, o que reforçou o contraste e a segregação social.

Os exemplos europeus mostram, com clareza, a complexidade inerente ao modelo de gestáo lastreado em grandes intervenções urbanísticas. A identificação dos grandes projetos urbanos como estratégia de crescimento econômico implica, portanto, refletir sobre os motivos que contribuíram para a disseminação dessa lógica no contexto da gestáo urbana, seja do ponto de vista teórico, seja no que tange às transformaçóes na economia brasileira a partir da crise dos anos 1980, quando o modelo de crescimento baseado no endividamento externo entrou em colapso. Isso significa afastar modismos em favor da análise serena dos custos e benefícios advindos dos grandes projetos urbanos.

Na expectativa de contribuir para o debate, este artigo trata das experiências de São Paulo e Rio de Janeiro. Na primeira cidade, estudou-se a Operação Urbana Faria Lima e, na segunda, os Jogos pan Americanos de 2007. De pronto, vale anotar que os exemplos selecionados, embora referidos a temporalidades, programas e montante de recursos distintos, estão inseridos na mesma lógica econômica. Ou seja, ambos os projetos são apresentados como estratégias localizadas, capazes de garantir o desenvolvimento econômico.

Por fim, vale a pena lembrar que o Brasil deverá sediar dois eventos de grande repercussão internacional, a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Estes projetos, como os investigados nesse texto, vêm sendo justificados como estratégias de desenvolvimento. Portanto, a reflexão sobre as experiências brasileiras recentes pode contribuir para clarear as ideias das açóes em curso, náo apenas no Brasil, mas, igualmente, em outros países subdesenvolvidos.

O artigo está organizado em cinco sessões, além dessa introdução. A primeira aborda a lógica econômica dos grandes projetos urbanos. Em seguida, apresentouse o contexto econômico e político brasileiro, particularmente as finanças públicas, de forma a explicitar como o pensamento neoclássico alcançou a gestão urbana. A terceira sessáo trata da experiência de Sáo Paulo, seguida pela investigação do Rio de Janeiro. As considerações finais são dedicadas à análise comparativa entre São Paulo e Rio de Janeiro, daí extraindo elementos para o esboço das perspectivas brasileiras no futuro próximo.

Cidades e desenvolvimento econômico

Os motivos que colocaram as cidades no centro do debate sobre crescimento econômico estão relacionados com as mudanças ocorridas no capitalismo no último quartel do século XX. Em breves traços, a manutenção do pacto baseado nas políticas de bem-estar social exigia a permanente ampliação da produtividade no modelo fordista-keynesiano. Nos anos 1970, quando o crescimento da produtividade começou a declinar, a compressão dos lucros do capital tornou insustentável a manutenção daquele modelo de crescimento econômico. O colapso do keynesianismo abriu caminho para o ressurgimento das políticas de inspiração neoclássica, culminando no conjunto de recomendações consagradas no Consenso de Washington.

Nos países centrais, importantes centros industriais vinham sendo atingidos pelo esvaziamento econômico em razão das novas formas de organização da produção, propiciadas pelo aumento da flexibilidade da localizaçáo industrial (Swyngedouw et al.). Num contexto de acirramento da concorrência internacional, a decisão locacional transformou-se em estratégia de redução de custos. Ao lado disso, o avanço tecnológico ampliou as alternativas locacionais, seja pela redução das escalas mínimas de produção, seja integração de informações e processos. Em suma, a indústria se compactou em blocos integrados em busca de sítios que...

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