O impacto da globalizacao em Sao Paulo e a precarizacao das condicoes de vida **. - Vol. 29 Núm. 87, Septiembre 2003 - EURE-Revista Latinoamericana de Estudios Urbanos Regionales - Libros y Revistas - VLEX 56589724

O impacto da globalizacao em Sao Paulo e a precarizacao das condicoes de vida **.

Autorda Silva Leme, Maria Cristina

Resumo

O trabalho analisa os processos que vêm transformando, recentemente, São Paulo do ponto de vista econômico e social. Ao abordar o impacto da reorganização do sistema produtivo na localização das atividades industriais e de comercio e serviços, procura avançar no entendimento dos determinantes atuais da estruturação do espaço urbano. Para isso retoma as principais etapas de constituição de São Paulo como metrópole no decorrer do século XX. Discute os impasses atuais da modernização econômica e a precarização das condições de vida.

Palavras-chave: globalizaçao, metropolização, São Paulo.

Abstract

This work analyses the processes that have recently transformed Sao Paulo from an economic and social point of view. When approaching the impact of reorganising the productive system in the location of activities, it seeks to enhance the understanding of the present determinants in the urban space structuring. For this, it retakes the main constitution phases of Sao Paulo as a metropolis during the XX century. It discusses the present stalemates of the economic modernisation and the deterioration of living conditions.

Keywords: globalization, metropolization, Sao Paulo.

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  1. A formação da cidade

    O primeiro efeito da expansão da produção cafeeira sobre a cidade de São Paulo, na metade do século XIX, foi ampliar sua função o de entreposto comercial. Pela cidade cruzavam-se as rotas comerciais entre o litoral e o interior do Estado de São Paulo, entre o sul e o Rio de Janeiro, capital do país e entre o interior e Mato Grosso.

    Apesar do comercio cafeeiro localiza--se sobretudo em Santos, é São Paulo, capital do Estado que vai sediar as matrizes dos estabelecimentos bancários, dependentes, em alto grau, da política econômica do governo. Outro fator próprio da economia cafeeira que tem impacto no desenvolvimento da cidade foi o fato dos fazendeiros de café fixarem residência na cidade. Para eles a comercialização era tão importante quanto a produção. A vinda dos fazendeiros para a cidade representou o loteamento de chácaras e a abertura de novos bairros.

    Até a metade do século XIX a cidade de São Paulo está confinada na colina central em posição ligeiramente elevada que garantia a defesa aos ataques. Nesta área, limitada por um lado pelo córrego do Anhangabaú e pelo outro lado pelo Rio Tamanduateí, moravam as elites paulistanas dividindo o espaço com casas de aluguel e cortiços. Alí localizavam-se, também, o comercio de luxo e as grandes casa bancárias.

    A expansão do núcleo central se fez em duas direçoes, para o lado leste, servidos pela ferrovia e separados da colina central pela várzea inundável do rio Tamanduateí, vão se situar os bairros industriais e de moradia operária e do outro lado em uma área alta, plana e mais saudável irão se localizar os loteamentos de classe de renda mais alta. Estes vetores sinalizam o inicio do processo de segregação sócio espacial na cidade de São Paulo.

    A construção do Viaduto do Chá unindo os dois lados do vale do Anhangabaú possibilitou o deslocamento das atividades comerciais do centre em direção aos bairros de moradia das classes de renda mais alta e resultou em uma bipartição do centro. Na parte nova, alem do Anhangabaú localizam se os escritórios de profissionais liberais, o comercio de luxo, os cinemas, restaurantes dirigidos às classes de renda mais alta. No outro lado do vale, no núcleo histórico, permanecem o comercio e serviços das classes populares. Estudando a lógica deste processo de estruturação do espaço urbano Flavio Villaça (1998) desenvolve a tese sobre a relação entre o deslocamento das atividades de comercio e serviços de maior prestígio e das instituições públicas na direção do vetor de desenvolvimento da moradia das classes de renda mais alta.

    O processo de deslocamento de atividades se faz com a substituição das ediflcações térreas e de sobrados. Somekh (1997), ao descrever o processo de verticalização em São Paulo, observa que no periodo entre a metade da década de 20 e o final da década de 30 ocorre o processo de verticalização, tanto na área do triângulo central, como nos bairros do outro lado do vale do Anhangabaú. Como mostra a autora ,a verticalização até 1939 era urn fenômeno tipicamente central e predominantemente tarciário, segue-se um período de construção de edificios predominantemente residenciais localizados nos bairros próximos ao centro.

    Nos anos sessenta inicia- se um novo processo de separação e especialização das atividades de comercio e serviços. Confirman do o vetor de expansão em direção sudoeste instalam- se na prestigiosa Avenida Paulista edifícios de escritórios e serviços financeiros ocupando os lotes das residências.

  2. A formação da metrópole

    A correspondência entre a expansão do setor cafeeiro e o nascimento da atividade industrial data do século XIX. A relação de dependência entre os dois setores se manifesta tanto no período de auge da acumulação cafeeira, quando os lucros estavam acima da capacidade de inversão no setor e o capital se desloca para a industria, como, também, nos periodos de baixa, quando a industria se beneficia do declínio das importaçoes, absorvendo a capacidade ociosa e produzindo mais.

    Oliveira (1982) observa que quando a "industrialização começa a ser o motor da expansão capitalista no Brasil, ela tem que ser simultaneamente urbana e tern que ser fundamentalmente urbana porque não pode apoiar-se em nenhuma pretérita divisão social do trabalho no interior das unidades agrícolas" (42). Isto significava que as indústrias para a produção de um bem não durável de consumo (o exemplo utilizado pelo autor 6 a industria Matarazzo) precisavam instalar dentro de si, toda uma complexa divisão social do trabalho, desde a produção de bens de capital até as atividades de apoio à comercialização e distribuição.

    Esta concentração de diferentes atividades em uma única unidade industrial exigia, segundo Oliveira, por um lado alto grau de capitalização, o que explicaria a concentração de capital e a tendência à formação de oligopblios e conglomerados e dialéticamente, baixa capacidade de acumulação em função da baixa produtividade do trabalho. A abertura de novos postos de trabalho em função deste processo particular de industrialização atraiu à cidade grandes levas de migrantes.

    A industria paulista teve seu grande salto qualitativo entre 1907 e 1919 quando passa a concentrar 31% da produção nacional. Na década seguinte a mudança será qualitativa diversificando a produção e introduzindo alguns setores mais din&micos de bens de produção como a industria de cimento, fabricação de motores elétricos e maquinas têxtil.

    A crise do café, em 1929 e a revolução de 30 têm sido consideradas como os marcos da transição da denominada Repúlica Velha ou Primeira Republica e o novo regime político que se instala com o golpe militar de Getúlio Vargas em 1937. Dois aspectos destes acontecimentos são importantes para se compreender as relações particulares que se darão ao nível local: a passagem de uma atividade econômica em que o centro dinâmico é a atividade agricola para exportação, para a atividade industrial e o rompimento da organização política descentralizada, apoiada no alto grau de autonomia dos estados federados em favor do fortalecimento do poder central.

    Esta passagem, tanto em termos políticos como econômicos, não pode ser vista, simplesmente, como uma relação de opposição ou complementaridade, mas como uma relação de contradição, que estaria nas próprias origens da formação do capital cafeeiro, na existência de outras atividades, incluindo as indústrias, não diretamente vinculadas à exportarção, mas articuladas à expansão da produção cafeeira.

    Saes (1986) observa que "a crise de 1929 e a grande depressão dos anos trinta, ao darem a industria posição de crescente importância, vinham, portanto, acentuar e confirmar os rumos do desenvolvimento do capital cafeeiro [...] A partir de então as diversas frações de capital assumem sua própria identidade, as ligações entre frações se tornam tênues, parece possivel a partir de 1930, encontrar uma burguesia 'bancária', uma burguesia agrária, uma burguesia comerciar' (277).

    A implantação de um Estado forte e centralizado, a partir de 1937, significou de fato, não a exclusão de interesses econômicos dominantes do periodo anterior, mas sim uma redefinição de canais de acesso e influência com o poder central. Os investimentos do governo federal, nos anos 30, para o desenvolvirnento industrial, resultaram na concentração no Estado de São Paulo da maior parte dos estabelecimentos industriais, da produção e do pessoal ocupado. Neste periodo, a política de proteção à indústria nacional fazia com que o capital industrial paulista ditasse as regras fortalecendo ainda mais sua hegemonia. Na década de cinquenta, no governo de Juscelino Kubitschek, uma...

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