A Metropole Belem e sua centralidade na Amazonia Oriental Brasileira. - Vol. 41 Núm. 124, Septiembre 2015 - EURE-Revista Latinoamericana de Estudios Urbanos Regionales - Libros y Revistas - VLEX 636921213

A Metropole Belem e sua centralidade na Amazonia Oriental Brasileira.

AutorCardoso, Ana
CargoTexto en portugues - Ensayo

Introducao

A regiao metropolitana de Belem, atualmente com cerca de 2,4 milhoes de habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica [ibge], 2010), apresenta especificidades proprias de sua insercao como metropole regional na Amazonia. Aspectos ligados a migracao campo-cidade e ao papel historico da cidade de Belem como no central de uma rede dendritica (Correa, 1987), transformaram a capital e seu entorno em um dos principais mercados estruturadores da dinamica economica da Amazonia Oriental Brasileira. Essa caracteristica historica foi fortalecida e reestruturada recentemente pelo processo de migracao da populacao de baixa renda das regioes contiguas (principalmente Marajo e Baixo Tocantins), areas nao incluidas no escopo dos grandes projetos de capital intensivo implantados no Para a partir dos anos 1960.

Tal dinamica migratoria regional, somada a expansao da fronteira urbana na Amazonia nos ultimos anos, contribuiu para a metropolizacao de Belem durante as decadas de 1970 e 1980. Nesta perspectiva, a literatura que aborda o processo de desenvolvimento territorial ocorrido na Amazonia na segunda metade do seculo XX (Becker, 1982; Correa, 1987; Machado, 1992, 1989), ressalta a importancia do processo de integracao rodoviaria (impulsionada pela expansao da fronteira) das regioes sul e sudeste do Para ao restante do pais (eixos da Belem-Brasilia e PA 150).

Neste sentido, segundo Trindade Jr. (1998), a expansao da fronteira e a da Regiao Metropolitana de Belem seriam verso e reverso da mesma moeda, na medida em que esta Regiao Metropolitana passou a assumir novas centralidades ligadas as atividades de comercio e servicos oriundas do processo de desenvolvimento de atividades produtivas em sua area de influencia. Estas caracteristicas ligadas a integracao territorial da Amazonia ao Brasil e a formacao historica da cidade de Belem como cidade primaz de um vasto territorio integrado por via fluvial; constituem-se em especificidades que destacam um duplo movimento que caracteriza, nos dias de hoje, o seu papel na formacao da rede de cidades na Amazonia Oriental Brasileira.

Neste sentido, um dos principais objetivos do presente artigo e trazer para o debate historiografico, hoje em voga sobre a Amazonia, o argumento sobre a especificidade da RMB como espaco urbano; onde ao mesmo tempo se conjuga uma centralidade economica moderna, baseada em atividades de comercio e servicos que se organizam a partir de sua integracao com os centros dinamicos regionais, nacionais e internacionais, e uma economia tradicional que se organiza ainda principalmente por meio do transporte fluvial e da dinamica das pequenas e medias atividades produtivas da regiao, assim como da dinamica e fluxo das populacoes ribeirinhas localizadas no entorno de seu hinterland. Essa localizacao urbana peculiar foi de fundamental importancia para o desenvolvimento de uma nova dinamica que tem impulso no final do seculo XX e que hoje compoe uma rede de comercio e servicos metropolitanos em escala ampliada.

Com o intuito de desenvolver os argumentos principais do presente trabalho, inicia-se com uma reconstituicao da trajetoria historica de formacao da RMB; em seguida desenvolve-se uma leitura geral do processo de metropolizacao no Brasil no seculo XX, com enfase especial na Amazonia Oriental Brasileira; discute-se a posicao atual da RMB no contexto de formacao da rede de cidades na Amazonia; por fim analisa-se o processo de metropolizacao e desmetropolizacao em curso vis-a-vis a evolucao recente da Estrutura do Mercado de Trabalho e da Participacao Setorial do pib da RMB.

Formacao historica da Regiao Metropolitana de Belem

O aglomerado que originou a cidade de Belem surgiu como posto de defesa e entreposto comercial das rotas coloniais portuguesas a partir do seculo XVII. Esse nucleo assumiu os servicos de controle de producao e exportacao da economia colonial devido a sua posicao estrategica na desembocadura de grandes rios (Para, Tocantins e Amazonas), a epoca unico modal de transporte da regiao. Com o decorrer do tempo, o aglomerado urbano se expandiu, avancou sobre a floresta, se diversificou e se destacou dos demais. Por seculos, Belem prosseguiu como base para a exportacao de produtos amazonicos.

A distribuicao de assentamentos ao longo dos grandes rios, como local de armazenagem da producao extrativista, foi uma estrategia colonial importante para a penetracao na floresta e exploracao de seus recursos naturais. Essa formacao estruturou uma rede dendritica, tipica de sociedades de economia mercantil em que Belem desempenhava a funcao de cidade primaz, e que lhe garantiu a condicao de principal porto de toda a Amazonia brasileira ate o inicio do seculo XX (Correa, 1987; Vicentini, 2004).

Com a organizacao produtiva do extrativismo em grande escala, passaram a circular na cidade funcionarios da administracao colonial e comerciantes, prestadores de servicos e membros do clero que, aos poucos, consolidaram uma estrutura e um corpo locais. Dada a natureza contabil e administrativa das atividades mercantis, a paisagem da cidade e a gestao do comercio passaram a expressar o sucesso ou fracasso dos ciclos de produto (drogas do sertao, borracha, etc.) e viabilizam a formacao de elites locais que modelaram a cidade a partir de suas visoes de civilizacao. O enriquecimento ocorrido durante o ciclo da borracha, que correspondeu a segunda metade do seculo XIX e primeira decada do seculo XX, viabilizou transformacoes importantes nessa organizacao socio-espacial, com destaque para a imp lantacao de uma ferrovia que estruturou a primeira ocupacao continua da Amazonia Oriental, ocorrida na regiao Nordeste do Estado do Para. Mesmo que os produtos da floresta chegassem por barco, a diversificacao crescente das atividades economicas aumentou a aglomeracao de habitantes com outras preferencias e criou a necessidade de abastecimento de outros produtos agricolas, produzidos nessa regiao.

A ferrovia ligava a capital, Belem, a cidade de Braganca, na costa atlantica, e se constituia em estrategia de ocupacao do territorio completamente diferente da logica ribeirinha dendritica prevalecente ate entao (Vicentini, 2004). Era composta por tres ramais: um se constituiu no eixo estruturador da ocupacao da segunda legua patrimonial de Belem (1) (Ventura Neto, 2012); o segundo viu transformadas suas estacoes na maioria das sedes municipais que compoem a RMB atualmente; e o terceiro originou o tracado do acesso por estrada de Belem ao resto do Brasil.

Apos o fim do ciclo da borracha em 1910, a regiao nordeste do Para continuou abastecendo a capital com produtos agricolas, e na medida em que outras atividades foram associadas as paradas do trem, ocorreu a consolidacao das novas aglomeracoes (cidades e vilas) e adensamento da urbanizacao na regiao, que passou a articular os nucleos de ocupacao ribeirinha e continental. O crescimento da producao agricola com base na agricultura camponesa se estabelecia inequivocamente e favorecia a formacao de cidades e de relacoes entre elas.

E relevante lembrar que, antes da integracao nacional, Belem deteve centralidade mercantil e industrial no cenario regional, e contou com uma populacao migrante de diversas origens. Na primeira decada do seculo xx, a matriz europeia de vida cultural manifestou-se no respeitavel numero de jornais, revistas, agremiacoes culturais e de salas de cinema existentes na cidade (Coelho, 2005). Em 1872 a cidade contava com 12% de estrangeiros na populacao, e destes 80% eram portugueses (Emmi, 2010), essa comunidade viabilizou equipamentos como o Hospital da Beneficiencia implantado em 1877, que se mantem ate hoje como referencia no Estado. O cotidiano cosmopolita, a vida cultural intensa e as intervencoes urbanisticas de inspiracao francesa promovidas por Antonio Lemos a partir de 1902 deram a cidade certa visibilidade internacional, ratificada pela existencia de rotas diretas para a Europa, e pela pratica de modismos da epoca (Sarges, 2002).

Em analise do setor industrial em Belem, Costa (2012b) discorre sobre o declinio relativo da cidade enquanto centro regional apos a queda do preco da borracha. A opulencia e a renda geral foram perdidas, o comercio e o extrativismo da borracha perderam participacao no pib, mas emergiram outras atividades com maior nivel de diversificacao produtiva, abrangendo desde as atividades extrativas de outros produtos ate a industria, que no ano de 1907 estava constituida por 146 empresas e em 1940 por 912 unidades, concentrada predominantemente em Belem, onde o numero de empregos era quase cinco vezes maior que nas outras duas cidades citadas na obra, Manaus e Rio Branco. Apesar da baixa incorporacao tecnologica, esse fato manifestava uma diversidade de atividades inexistente em outras cidades amazonicas no mesmo periodo, mas incapaz de resistir aos efeitos do processo de integracao implantados pelo governo federal a partir da abertura da BR 010 (Belem-Brasilia). As tentativas de diversificacao industrial nao resistiram a concorrencia criada pelas industrias de outras regioes do pais, ao que se pode acrescentar ainda as limitacoes de condicoes de financiamento, gerenciamento e a matriz energetica da regiao. Note-se que estas iniciativas de industrializacao ocorreram em Belem por iniciativa do setor privado, meio seculo antes do inicio das acoes do governo federal para integracao da Amazonia, em resposta ao isolamento da regiao em relacao ao resto do pais, e gracas a reserva de capital mercantil acumulada no decorrer do ciclo da borracha.

Em Belem, a atividade industrial floresceu ate o fim da Segunda Grande Guerra, concentrada no bairro do Reduto, adjacente a area portuaria (ver Figura 1). No entanto, o fechamento das industrias no final dos anos 1950 transformou o patrimonio imobiliario no ativo mais expressivo do espolio industrial, sobrevalorizado decadas depois com uma acao de macrodrenagem nessa area industrial da cidade (2). Essa acao de macrodrenagem foi promovida...

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