A inflação legislativa em matéria de crime organizado no Brasil: uma análise crítica
Autor | Cíntia Toledo Miranda Chaves |
Cargo | Doutoranda em Direito Penal pela Universidad Pablo de Olavide, Sevilha, Espanha |
Páginas | 27-38 |
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A INFLAÇÃO LEGISLATIVA EM MATÉRIA DE CRIME ORGANIZADO NO
BRASIL: UMA ANÁLISE CRÍTICA
C T M C
Universidade Federal de Juiz de Fora (Brazil)
“A história humana não se desenrola apenas nos campos de batalha
e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola também nos quintais,
entre plantas e galinhas; nas ruas de subúrbio, nas casas de jogo,
nos prostíbulos, nos colégios, nas ruínas, nos namoros de esquina.
Disso quis eu fazer a minha poesia, dessa vida obscura e injustiçada,
porque o canto não pode ser uma traição à vida,
e só é justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas
e as coisas que não têm voz”.
Ferreira Gullar
INTRODUÇÃO
Mensagem corrente no discurso punitivo oficial é o necessário aumento da agressividade
legislativa em razão do crescimento “vertiginoso” do fenômeno da criminalidade organizada,
cuja delimitação, quer desde o ponto de vista jurídico, quer criminológico, ainda está longe
de ocorrer, se é que tal proeza poderá ser atingida algum dia. A conseqüência é a maximização
dos perigos e riscos de referida criminalidade (ou, dito de outra forma, o aumento do
discurso do medo) para que se possa buscar uma suposta legitimidade no endurecimento
do sistema punitivo. Não é exagerado dizer que a temática sobre a criminalidade organizada
ocupa um lugar proeminente, tanto para opinião púbica como para os estudiosos do Direito
penal, políticos, mídia e imaginário popular, para não dizer nas ficções cinematográfica
hollywoodianas. Tal constatação, evidentemente, não quer aqui demonstrar a gravidade do
problema mas, fundamentalmente, os aspectos ideológicos e os motivos pelos quais se dá
“tamanha importância” à temática.
O medo é instrumento utilizado há muito para legitimar a repressão penal. Segundo
Vera Malaguti, “trabalhar o medo como fio condutor discursivo de uma política pressupõe
o que Gislene Neder interpretou como o conjunto de alegorias do poder e a produção
imagética do terror que compõem então um papel disciplinador emergencial”2. Assim, a
1 Doutoranda em Direito Penal pela Universidad Pablo de Olavide, Sevilha, Espanha. Professora de Direito
Penal das Faculdades Integradas Vianna Junior e do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais da Universidade
Federal de Juiz de Fora. cintiatoledo@hotmail.com
2 B, Vera Malaguti, A arquitetura do medo, In: Discursos Sediciosos. Ano 7, n 12. Editora Revan (Rio de
Janeiro, 2002), p. 99.
Corpus Iuris Regionis.
Revista Jurídica Regional y Subregional Andina 8
(Iquique, Chile, 2008) pp. 27-38
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